segunda-feira, 1 de agosto de 2011

ENTREVISTA ESPECIAL Marchezan diz José Dirceu (PT, chefe da Casa Civil da presidência de 2003 a 2005) foi o grande articulador, passou todos esses anos fora do governo, mas continua comandando

PT se apropriou das bandeiras do PSDB, aponta Marchezan - Paula Coutinho e Samir Oliveira - JORNAL DO COMERCIO, Notícia da edição impressa de 01/08/2011



''O PSDB não participou do governo Yeda Crusius, não teve voz ativa'', diz Marchezan.Presidente do PSDB no Rio Grande do Sul e vice-líder da oposição na Câmara dos Deputados, o deputado federal Nelson Marchezan Júnior faz uma crítica contundente das gestões do PT no País. “O PT privatizou todos os órgãos públicos.” E afirma que os episódios do mensalão deixaram uma herança de corrupção para o País. “José Dirceu (PT, chefe da Casa Civil da presidência de 2003 a 2005) foi o grande articulador, passou todos esses anos fora do governo, mas continua comandando. Essa é a história que o PT deixa.” O tucano avalia ainda que o PT se apropriou das bandeiras do PSDB, como o bolsa-escola. “São conquistas que o PSDB trouxe quando governou o País. Mas quem teve a benesse de comunicar sobre isso foi o Lula.”



Sobre o governo Tarso Genro (PT), opina que o petista montou uma estrutura de gestão e um secretariado fracos. Reconhece, no entanto, que Tarso é politicamente competente, qualidade que, analisa, faltou à ex-governadora tucana Yeda Crusius durante sua administração (2007-2010). “Falhou muito na comunicação e no relacionamento político.”

Marchezan também sustenta que o PSDB é um partido que mantém sua linha ideológica. “Há como ter coerência nacional e estadual, como ter coerência de discurso estando tanto no governo quanto na oposição.” E questiona benefícios recebidos por integrantes do Judiciário e do Ministério Público no Estado.

Jornal do Comércio - Quais são os seus projetos na presidência do PSDB gaúcho?
Nelson Marchezan Júnior - Os gaúchos têm simpatia pelo PSDB. Na eleição de 2010, (José) Serra (PSDB) ganhou de Dilma (Rousseff, PT) no Estado. Em 2006, (Geraldo) Alckmin (PSDB) também ganhou do Lula (PT) no Rio Grande do Sul. E a candidatura do PSDB ao governo (Yeda Crusius, em 2006) foi vitoriosa. O desafio é transformar essa simpatia em filiados, vereadores, prefeitos, deputados estaduais e federais.

JC - Ao assumir o governo do Estado em 2007, o PSDB rompeu a polaridade entre PT e PMDB. Mesmo com a derrota em 2010, é possível se manter como terceira força política?
Marchezan - Quebramos a polaridade e colocamos um discurso novo. O discurso de pagar as contas em dia é do PSDB, a avaliação do mérito no serviço público também foi trazida para pauta do Estado pelo PSDB. Mas por mais que tenhamos conseguido chegar ao governo, não conseguimos transformar isso em poder nos municípios, na Assembleia Legislativa e na Câmara Federal. E partido tem que querer poder. Partido que não quer cargo eletivo serve para fazer troca e barganha.

JC - Quem tem liderado a oposição ao governador Tarso Genro é a bancada do PMDB, que é a maior depois do PT.
Marchezan - O PMDB é um partido com o qual temos dificuldade em nos aliar. O PSDB está na oposição em nível federal e estadual, primeiro, porque perdeu as eleições. Mas também porque desaprova o modelo dessas administrações. Precisamos mostrar que existe uma maneira de fazer política diferente do que está sendo feito. Há como ter coerência nacional e estadual. E há como ter coerência de discurso estando tanto no governo quanto na oposição. O partido que tem essa linha é o PSDB.

JC - O fato de o PSDB já ter sido governo no Estado ajuda ou atrapalha o partido?
Marchezan - Boa parte das bandeiras de gestão do partido foram implementadas no governo Yeda e são todas defensáveis. Mas o PSDB não saiu fortalecido do governo. E também não participou do governo, não teve voz ativa. A estrutura partidária, a executiva estadual, o diretório e os deputados não tiveram participação nas decisões e nos encaminhamentos políticos. É evidente que se o governo Yeda tivesse sido melhor nas suas habilidades políticas e na sua comunicação faria melhor para a imagem do partido.

JC - A governadora centralizava demais?
Marchezan - Não vai agregar nada ao PSDB buscar esse ou aquele culpado. Existe um consenso de que foi um excelente governo, principalmente até o seu segundo ano, e que falhou muito na comunicação e no relacionamento político. Constatado isso, vamos olhar para frente.

JC - Como avalia os governos Tarso e Dilma?
Marchezan - O PT se apropriou das bandeiras do PSDB, que não são novas. No Estado, o atual governo, nos seis primeiros meses, também está se apropriando de bandeiras do PSDB, que antes rejeitava. O governador disse que é preciso avaliar o mérito na educação. Também fala em austeridade fiscal. Mas o PT votou contra a Lei de Responsabilidade Fiscal. O PT também era contra o Plano Real.

JC - Essas contradições se concretizaram com a chegada do PT ao poder?
Marchezan - Tivemos uma década perdida. E perdeu não somente porque deixou de fazer os investimentos públicos necessários, mas porque a gestão do governo foi - e continua sendo - péssima. E não houve qualquer qualificação das nossas instituições. Foi uma década perdida também em termos de valores, de ética e de moral. O marco ilegal da era PT foi o episódio do mensalão com José Dirceu. Ele foi o grande articulador, passou todos esses anos fora do governo, mas continua comandando.

JC - A influência de José Dirceu ainda é forte no governo?
Marchezan - O diretor de crédito do Bndes (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) é indicado por ele. José Dirceu esteve no Estado, com o (ex-governador) Olívio Dutra de um lado e o (deputado estadual) Raul Pont do outro, palestrando para os jovens. O (ex-ministro da Fazenda durante a gestão de Lula e da Casa Civil no governo Dilma) Antonio Palocci (PT) caiu por corrupção duas vezes. E não vai perder um milímetro de poder, continuará mandando no governo. Essa é a história que o PT deixa.

JC - Mas Lula conseguiu aprovação recorde da população e elegeu sua sucessora.
Marchezan - Hoje alguém se apavora? Olha as denúncias que saem em todas as revistas semanais de circulação nacional. É catastrófico. A sociedade não se movimenta porque as instituições públicas estão dominadas. O PT privatizou todos os órgãos públicos. O PT pega quem está ganhando dinheiro e faz ganhar mais. Forma oligopólios e então entra de sócio. Isso é o poder público corrompido entrando na iniciativa privada. Os grandes e médios empresários que conhecerem um vereador de uma corrente tal do PT têm livre acesso à corrupção.

JC - O senhor está dizendo que só o PT é corrupto?
Marchezan - Não. A corrupção é corrupção em qualquer partido, em qualquer nível social. Mas, no caso do PT, a corrupção fez parte de um projeto institucional. O PT chegou ao governo dizendo que todos faziam e ele não fazia. E agora diz que, como todos fazem, ele também faz e isso é normal.

JC - Não reconhece nenhum avanço nas gestões do PT?
Marchezan - O Brasil avançou economicamente. Mas quando se avança menos que todos os vizinhos mais pobres, se está regredindo. Na crise mundial, o Brasil se beneficiou graças a um sistema financeiro organizado pelo PSDB, por possuir uma economia globalizada e estabilizada pelo PSDB e por ter um mercado aberto com recordes de investimento em infraestrutura e financiamentos a médio e longo prazo para a agricultura. O PT transformou um projeto de governo, que era o bolsa-escola, num programa partidário-eleitoral. Tudo isso são conquistas que o PSDB trouxe. Mas quem teve a benesse de comunicar sobre isso foi o Lula.

JC - E o governo Tarso?
Marchezan - Tarso é competente politicamente. Essa é uma das qualidades que o gestor tem que ter. Mas o governo montou uma estrutura de gestão e um secretariado fracos. As propostas que ele tem apresentado são meramente arrecadatórias e de busca de poder para o Estado. Quero lembrar que no Brasil vivemos um momento muito perigoso. Houve a destruição da lei mais avançada para as contratações e compras porque o Estado quer escolher para quem ele vai dar o dinheiro, quanto vai dar e quanto vai sobrar. Vai ser a maior roubalheira do Brasil, mais do que foi o mensalão, mais do que no Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit). Essa centralização de poder também acontece aqui no Estado. Os primeiros atos do governo foram para aumentar salários de cargos político-partidários. Não foi num setor ou categoria específica, foi o salário dos companheiros. E a questão da previdência continua com um rombo igual. Não teve nenhuma reforma.

JC - O PSDB tem um nome forte para 2014 no Estado?
Marchezan - Tem um pessoal jovem que quer oxigenar o partido. O PSDB deu uma grande virada, é uma nova fase. O candidato que vai concorrer em Pelotas tem 27 anos. O (deputado estadual Jorge) Pozzobom tem uns 40 anos, eu também, o (deputado estadual) Lucas (Redecker) tem 30 anos. Mas não temos hoje muitos nomes para 2014.

JC - E para 2012?
Marchezan - A orientação nacional e estadual é de que devemos ter candidatura própria nos municípios, especialmente nos estratégicos. A candidatura em Porto Alegre não é a minha prioridade pessoal. Quero continuar como deputado federal e presidente estadual do PSDB.

JC - Mas o partido é aliado ao prefeito José Fortunati (PDT), que tentará a reeleição.
Marchezan - Permanecer ou não no governo é uma decisão do PSDB de Porto Alegre. Enquanto fui presidente do municipal, minha orientação era de que deixássemos o governo.

JC - O senhor é um crítico do pagamento de auxílio-moradia no Judiciário e no Ministério Público (MP) gaúchos.
Marchezan - O pagamento da URV (Unidade Real de Valor) ao Judiciário foi ilegal. O Conselho Nacional de Justiça decidiu isso por unanimidade. Houve um prejuízo de mais de R$ 2,5 bilhões aos cofres estaduais. O MP mantém esse mesmo pagamento ilegal. Como acabou a URV, que dava em torno de R$ 15 mil por mês na média, começaram a pagar o auxílio-moradia retroativo de 1994 a 1998. O cidadão tem o seu direito precluso em cinco anos. Então, se houvesse o direito de o Judiciário gaúcho efetuar o pagamento, já estaria precluso. E se tivesse uma decisão transitada em julgado, eles (os juízes estaduais) teriam que entrar na fila dos precatórios, como fazem 30 mil famílias gaúchas.

JC - Há uma representação sua no Tribunal de Contas do Estado (TCE).
Marchezan - O processo está parado desde o final do ano passado.

JC - Estão ouvindo as partes.
Marchezan - Não tem que ouvir as partes. O Tribunal de Justiça está mantendo o pagamento ilegal mensal? Então, o TCE tinha que dar uma liminar e suspender. O Judiciário, com a URV e o auxílio-moradia, vai dar prejuízo ilegal aos cofres em torno de R$ 3,5 bilhões. Só que se acrescentar o MP, que já recebe URV e vai receber a partir do ano que vem o auxílio-moradia, somam-se algumas centenas de milhões. Se incluir a Assembleia e o TCE, chega a R$ 4 bilhões, no mínimo. Se esses órgãos e Poderes não tivessem se apropriado ilegalmente de recursos públicos, os precatórios estariam pagos.

JC - Há corporativismo?
Marchezan - É um conchavo, um corporativismo. Há casos de pessoas que receberam R$ 1 milhão ilegal de URV. Entrei nesse tema porque era o presidente da Comissão de Finanças da Assembleia. Não é uma questão pessoal, mas de cumprir uma função para a qual fui eleito.


Perfil
Nelson Marchezan Júnior, 39 anos, é natural de Porto Alegre. Viveu em Brasília no início da adolescência para acompanhar o pai, Nelson Marchezan, que foi deputado federal e ministro. Depois, retornou à Capital gaúcha para fazer o segundo grau. Cursou Educação Física e Comunicação Social. Formou-se em Direito. Antes de concluir o curso, morou seis meses em Londres e seis meses em Paris, onde trabalhou de garçom e faxineiro. Exerceu a advocacia, mas sua principal atividade é a política. Conta que se filiou ao PSDB nos anos 1990, mas só em 2002, quando foi eleito deputado federal, viu que não estava registrado no partido. Perdeu o cargo, mas se elegeu deputado estadual em 2006, o mais votado de seu partido. Nesse meio-tempo, foi diretor de Agronegócios do Banrisul, por três anos. Em 2008, disputou a prefeitura de Porto Alegre. Dois anos depois, foi o único deputado federal eleito pelo PSDB no Rio Grande do Sul. Em 2011, assumiu a presidência da sigla no Estado e a vice-liderança da oposição na Câmara dos Deputados.

http://jcrs.uol.com.br/site/noticia.php?codn=69117

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